Ao lado das cinco refinarias ainda à venda, a subsidiária
Petrobras Biocombustível, a Pbio, é outro ativo que terá o processo
de alienação cancelado pela futura gestão de Jean-Paul Prates na
Petrobras, dizem fontes próximas ao governo. Dona de três usinas no
Sudeste e no Nordeste, a Pbio voltaria, assim, a ser um dos pilares
da estratégia de descarbonização da estatal.
O Broadcast apurou que a ideia é retirar em definitivo a Pbio do
programa de venda de ativos da estatal e fortalecer sua produção,
sem no entanto abrir mão do desenvolvimento biocombustíveis de
última geração, como o chamado Diesel R (renovável) e o bioQAV, que
dominavam os planos futuros da atual administração.
“As duas frentes podem conviver perfeitamente, uma já
consolidada e outra ainda em desenvolvimento”, diz uma fonte
familiarizada com o assunto. Em fim de mandato como senador, Prates
foi indicado pelo governo para comandar a Petrobras e aguarda o
aval da área de conformidade da empresa e do Conselho de
Administração para assumir a presidência da Petrobras (BOV:PETR3)
(BOV:PETR4).
Outra fonte, do entorno de Prates, diz que todos os processos de
venda de ativos serão, no mínimo, paralisados para reavaliação. Mas
alguns devem ser extintos logo, caso das refinarias e da Pbio.
Especialistas ouvidos não se opõem ao cancelamento da venda e
revitalização da Pbio, mas ressaltam a necessidade disso estar
alinhado com uma política nacional de favorecimento de
biocombustíveis.
Para o coordenador-técnico do Instituto de Estudos Estratégicos
de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), Rodrigo Leão,
que integrou o grupo de transição voltado à energia, é
imprescindível que o governo retome o aumento gradual dos
porcentuais de biodiesel na mistura do diesel, dando
previsibilidade ao mercado, e devolva diferencial tributário aos
biocombustíveis. O governo Jair Bolsonaro (PL) segurou o porcentual
de biodiesel no diesel em 10%, cancelando a diretriz de elevá-lo a
15% já este ano, e reduziu impostos sobre combustíveis fósseis.
Segundo Adriano Pires, da consultoria Centro Brasileiro de
Infraestrutura (CBIE), o plano de venda da Pbio fazia sentido no
auge da crise da Petrobras e sua reversão agora, com eventual
aumento de investimentos, não deve ser encarado como problema
porque a Petrobras está saudável do ponto de vista
econômico-financeiro. “Mas deve prevalecer a taxa de retorno
econômica e não a política, que marcou o início da Pbio”, adverte
Pires.
A representante dos funcionários no Conselho de Administração da
Petrobras, Rosângela Buzanelli, disse ontem (18) que, com a chegada
de Prates, os planos estratégico e de desinvestimentos da Petrobras
serão revistos, processo que implica diretamente os biocombustíveis
da companhia.
“O biodiesel vai entrar [nessa revisão], seja como biodiesel
puro, seja como diesel verde. Vamos reabrir essas usinas para já,
se depender de mim”, disse Buzanelli durante entrevista ao programa
“Debate Petroleiro”, transmitido pelo Youtube.
Histórico
Fundada em 2008, a Pbio foi por anos uma das maiores produtoras
de biodiesel do País, com usinas capazes de processar óleo de soja,
algodão, palma, gordura animal e óleos residuais, tudo para
aproveitar a dinâmica sazonal dos preços de cada matéria-prima.
A operação decaiu a partir de 2016, quando houve, inclusive, a
hibernação da usina de Quixadá (CE). Quando Pedro Parente assumiu a
Petrobras no governo tampão de Michel Temer (MDB), optou por
enxugar a estatal, reduzindo investimentos fora de exploração e
produção de óleo e gás, o que afetou a subsidiária de
biocombustíveis.
A nova estratégia implicou a aceleração do programa de
desinvestimentos nas gestões seguintes, o que culminou no início do
processo de venda da Pbio em julho de 2020, quando foi aberta a
etapa de oportunidade para o mercado, o “teaser”. Um mês depois foi
iniciada a fase não vinculante do processo e, em setembro daquele
ano, foi inaugurada a fase vinculante.
Antes e durante esse processo foram concluídas vendas de
participações da Pbio na BSBios, a maior produtora de biodiesel do
país, sediada no Rio Grande do Sul, e na Belém Bioenergia Brasil
(BBB), joint venture com a Galp, que comprou a outra metade do
negócio. Mas, dois anos depois de colocada à venda, a Pbio e suas
usinas próprias não chegaram à etapa de assinatura do contrato de
compra e venda.
Mesmo assim, a direção da Petrobras não retira a Pbio da lista
de desinvestimentos e nem aponta recuo no processo. Ao contrário,
têm reforçado a estratégia “agregar valor ao parque de refino com
processos mais eficientes e produtos novos, como o BioaQAV, o
Diesel Renovável e biobunker”.
Relatório da auditoria KPMG obtido pelo Broadcast informa que a
Petrobras não fixa data para efetivação dos desinvestimentos em
biodiesel e que há orçamento aprovado para a continuidade das
operações das usinas de Montes Claros (MG) e Candeias (BA) para os
próximos cinco anos. Essas unidades têm mantido fator de utilização
nas casas dos 70% e 50% respectivamente, bem abaixo de sua
capacidade instalada. Hibernada desde 2016, a usina de Candeias não
produz.
O argumento central da atual gestão é maximizar valor aos
acionistas. De fato, na maior parte de sua existência, a Pbio foi
deficitária ou apresentou lucro modesto para o sistema Petrobras, o
que aconteceu por quatro anos entre 2017 e 2020, quando houve lucro
de R$ 154,5 milhões. No ano seguinte, 2021, houve prejuízo líquido
de R$ 241,8 milhões e, em 2022 até setembro, houve prejuízo de R$
117 milhões.
Analistas
Miguel Lacerda, ex-diretor de Biocombustíveis do Ministério de
Minas e Energia (MME) e pesquisador da Embrapa, afirma que a Pbio
pode ser perfeitamente rentável, mas destaca que a subsidiária
nunca terá margens comparáveis às da exploração e produção de
petróleo em função da natureza do negócio e da competição no
setor.
“Existem cerca de 270 usinas de biocombustíveis no País, quase
40 só de biodiesel, enquanto a operação da produção de petróleo
ainda é quase monopolista”, compara.
Lacerda diz que os prejuízos da Pbio aconteceram em linha com
todo o setor, em função de fatores externos, como dinâmica de
preços, recuo no mandato do biodiesel, que deveria avançar para 15%
mas voltou a 10% a fim de frear o preço final dos combustíveis.
Individualmente também pesa o fato de as três usinas estarem
localizadas em estados (Minas, Bahia e Ceará) sem diferencial
tributário para a atividade, sobretudo ICMS reduzido, como acontece
em Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul.
Rodrigo Leão, do Ineep, afirma que a Pbio deve ser encarada para
além do desempenho financeiro, por ser um vetor de descarbonização
da Petrobras e indutora da economia agrícola no entorno de suas
unidades. Leão destaca que as principais economias do mundo, como
Estados Unidos, China e Índia, têm mantido políticas agressivas de
fomento a combustíveis de origem vegetal, enquanto o Brasil,
pioneiro na tecnologia, recuou de forma deliberada nos últimos
anos.
“A importância dos biocombustíveis para a transição energética
está colocada no mundo e, também, para as grandes empresas privadas
do setor com atuação no Brasil, que têm investido cada vez mais em
etanol”, diz, ao citar Shell e BP.
Adriano Pires, do CBIE, diz que a volta do investimento da
Petrobras em biocombustíveis, sobretudo biodiesel, é válida desde
que feita com “parcimônia”. “O ‘core business’ da Petrobras é e
deve continuar sendo exploração e produção [de óleo e gás], em que
ainda haverá muita demanda [por investimentos] do Pré-Sal e da
entrada em toda a Margem Equatorial”.
O especialista ressalta, também, a necessidade de perseguir a
rentabilidade econômica, o que, diz, foi negligenciado na origem da
subsidiária. Para Pires, as usinas custaram caro e interesses
políticos teriam pesado na escolha de sua localização, o que não
pode se repetir.
Informações Broadcast
PETROBRAS PN (BOV:PETR4)
Historical Stock Chart
From Sep 2024 to Oct 2024
PETROBRAS PN (BOV:PETR4)
Historical Stock Chart
From Oct 2023 to Oct 2024