O Bradesco deve anunciar em breve mudanças sob a gestão do novo
presidente, Marcelo Noronha. Segundo o presidente do Conselho de
Administração do conglomerado, Luiz Carlos Trabuco Cappi, a
expectativa é de que o banco ganhe velocidade.
“Em um mundo em transformação acelerada, a importância é
acelerar o passo com muito senso de urgência naquilo que deve ser
feito. É a expectativa”, diz o banqueiro, em entrevista ao
Broadcast, em Davos, na Suíça, onde está para participar do Fórum
Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês).
Passado um ano do início da crise da Americanas, e que deu
origem a um dos casos de recuperação judicial mais complexos da
história corporativa brasileira, o chairman do Bradesco (BOV:BBDC3)
(BOV:BBDC4) alerta para a necessidade de reforço na governança e na
regulação. O executivo também lista as três agendas globais
prioritárias: meio ambiente, paz e crescimento. Abaixo, a segunda
parte da entrevista:
Broadcast: Quais são suas expectativas para
Davos neste ano? Além de mais frio…
Trabuco: O tema de Davos neste ano é reconstruir a confiança,
que é a base de tudo. A confiança é o que dá um estado de
serenidade para enfrentar o desafio. Davos é um centro de reflexão,
aponta rumos, debate tendências, é um fórum eclético e acaba sendo
uma caixa de ressonância do mundo globalizado. Davos tem dado uma
direção de fortalecimento ao longo desses anos, superando até
momentos um pouco mais críticos. Agora, o mundo tem três agendas
inescapáveis.
Broadcast: Quais?
Trabuco: A primeira é a agenda ambiental e é a mais importante
do ponto de vista estratégico e existencial do Planeta. A segunda é
a paz. O mundo tem presenciado uma escalada de tensão geopolítica.
Além da tensão da política pela polarização, a geopolítica tem
mostrado escalada em todos os continentes, no Leste Europeu, na
Ásia, no Oriente Médio, de uma maneira muito evidente, e até na
América Latina, não só por algumas tensões entre países, mas,
principalmente, tensões dentro de países, como o Equador. Eu acho
que o mundo está em um estado de policrise.
Broadcast: E qual a terceira?
Trabuco: Se a primeira é a ambiental e a
segunda é a paz, a terceira grande agenda está ligada a essas duas.
Em um cenário de inflação sob controle, o desafio é fazer a
economia global voltar a crescer em um cenário de guerra e
conflitos e eventos climáticos. Não podemos subestimar esses
conflitos em detrimento da necessidade de crescimento da economia
mundial até para arrefecer as crises sociais e humanitárias como o
grande volume de refugiados e os efeitos da mudança do clima. A
expectativa em Davos é ouvir, discutir e refletir sobre mudanças,
estabilidade, de que os pensamentos básicos do ESG [sigla em inglês
para questões ambientais, sociais e de governança] possam oferecer
um mundo alternativo.
Broadcast: O que o tema de Davos significa para
o Brasil?
Trabuco: Olhando para o Brasil, as notas de
rating no final do ano passado foram um sinalizador importante. O
grau de investimento do Brasil é possível? Sim, é possível. Agora,
é uma trajetória que precisa ser trabalhada. A nota não é
miraculosa, reflete o trabalho feito, a capacidade de entrega e o
senso de urgência.
Broadcast: O sr. vê o Brasil recuperando o grau
de investimento no governo Lula?
Trabuco: É um objetivo a ser atingido. Eu não
saberia dizer o prazo, mas acho que ele tem de ser um objetivo
quase que do Estado brasileiro.
Broadcast: O ministro Haddad não participará do
fórum em Davos por conta da agenda doméstica, em um momento
sensível para a relação com o Congresso. Foi uma decisão
acertada?
Trabuco: O ministro está com uma agenda
bastante intensa na retomada do ano legislativo. Ele está querendo
ganhar todas as horas e dias possíveis para negociar e debater com
o Congresso a agenda que ele estabeleceu. Significa que ele está
demonstrando foco na ação, naquilo que deve ser feito.
Broadcast: Como o sr. avalia o trabalho do
ministro?
Trabuco: O ministro Haddad tem tido um
desempenho excepcional, uma contribuição efetiva para distensionar.
Ele é um homem que, pela postura, pelo traquejo político, foi um
ministro de Educação de destaque, um prefeito marcante na cidade de
São Paulo, um candidato a presidente da República, e reúne
condições de criar um ambiente mais leve no debate dos assuntos
econômicos brasileiros. É uma gestão muito positiva.
Broadcast: Voltando ao tema central do Fórum, o
Brasil conseguiu recuperar a confiança no exterior? Como o
investidor estrangeiro enxerga o Brasil?
Trabuco: O governo atual junto com o ministro
Haddad dá uma contribuição muito efetiva para o avanço nas relações
internacionais. A diplomacia, principalmente, a ambiental tem sido
uma marca que é reconhecida pelos investidores. Acho que o diálogo
e a presença têm sido reconhecidos pelos investidores. Isso é um
bônus para o governo.
Broadcast: Como o sr. vê o processo de
desinflação? Ainda há riscos de o fantasma dos preços voltar a
assombrar o mundo e o Brasil?
Trabuco: O processo inflacionário resultado do
período pós-pandemia, quando houve uma interrupção muito forte das
cadeias produtivas globais, e um resultado que a guerra na Ucrânia
provocou, que foi um pico do custo energético no mundo, piores
momentos, já ficaram para trás. Temos outra realidade e, por isso,
fala-se muito em uma desinflação no mundo. Os preços das
commodities ligadas ao agro, às proteínas animais e vegetais,
também bateram os seus recordes e se reduziram. Então, mesmo que
tenhamos uma redução na produção pelos problemas climáticos, eles
não vão voltar ao pico histórico, principalmente se analisarmos o
preço da soja, do milho ou do trigo. Os bancos centrais, que sempre
estão de olho muito atento à inflação de custos, estabeleceram um
controle efetivo para iniciar o afrouxamento da política
monetária.
- Outro evento de impacto no Brasil foi a crise das Americanas.
Qual foi a principal lição para o banco, para o empresariado
brasileiro?
Trabuco: Sem entrar no mérito da forma do
acontecido, a lição é sempre a mesma. Esses fatos que nos assombram
de tempos em tempos só corroboram a tese de que é preciso primeiro
cuidar daquilo que está ao nosso alcance. Do ponto de vista dos
princípios do ESG, fica muito patente que precisamos ter cada vez
mais cuidado com o pilar da governança, que tem princípios de
adesão voluntária, mas fica um espaço para a atuação dos
reguladores. Acho que deixou lições que têm de ser aprendidas.
Broadcast: O ano deve ser marcado por grandes
reestruturações de dívidas no Brasil, o que afeta o banco, apesar
da queda dos juros trazer algum alívio. Deve ser um período mais
duro após o caso Americanas? Há preocupação com algum setor em
especial? O varejo?
Trabuco: Não tem nada que indique problemas no
curto prazo e, até, ao contrário, a percepção é que as empresas
passaram por um processo de recuperação dos seus volumes
comerciais, da sua capacidade de gerar caixa com menor alavancagem.
Muitas passaram por ajustes administrativos que são efetivos para
essa recuperação. Então, a economia brasileira após a pandemia está
sólida e saudável, e não tem nada que indique problemas no curto
prazo.
Broadcast: Na pauta ambiental, que é a agenda
número 1 no mundo, segundo o sr., o governo vende o País como uma
potência verde, mas aprovou a extensão de benefícios a usinas de
carvão em um projeto que trata de energia eólica no mar. Não é
contraditório?
Trabuco: Pegando esse termo contraditório, eu
diria que o processo de transição energética pela sua própria
natureza é contraditório porque ele pressupõe eliminar certas
atividades econômicas que são rentáveis no modelo antigo e
substituir outras. Nós vamos ter de lidar com isso nesse processo
de conhecimento e amadurecimento. Agora, o importante é que nós
estamos avançando e essa é uma questão de tempo. A economia de
carbono zero está mudando e vai mudar mais.
Broadcast: Está claro que não é uma pauta da
moda?
Trabuco: Se alguns em um passado recente tinham dúvida de que as
mudanças climáticas viriam de uma maneira muito acentuada, o que
estamos vendo no mundo é uma coisa efetiva. A conscientização
aconteceu, a economia de transição energética acontece, e cada vez
mais acelerada, por isso, acho que o momento agora é o de criar
modelos, definir regras e oportunidades do negócio da transição
verde. A transição energética gera custos, eles são altos, mas são
de um efeito muito relevante para a estrutura econômica do mundo. O
portfólio de investimentos, e lembrando que esse vai ser um dos
drivers do PIB brasileiro nos próximos anos, está exatamente nessa
transição de uma nova economia, de baixo carbono.
Broadcast: Qual sua leitura sobre a inteligência
artificial? O sr. é do time dos assustados ou dos
otimistas?
Trabuco: A inteligência artificial, o mundo cada vez mais
digital, a internet, tudo isso são avenidas de duas mãos. A
sociedade vai refletindo sobre as bases éticas. Agora, a
inteligência artificial mudou, está mudando e vai mudar muito mais
o jeito de fazer negócio, de gestão. O grande ganho da inteligência
artificial, que até parece filosófico, é o da melhor compreensão do
ser humano e da sua circunstância. Não basta mais olhá-lo, mas
passa a importar a sua circunstância, a sua relação psicossocial na
sociedade. Então, é uma grande oportunidade.
Broadcast: O Bradesco começa 2024 sob nova direção. O
que podemos esperar em termos de mudanças?
Trabuco: Nós estamos passando por uma transição com a chegada do
novo presidente executivo, Marcelo Noronha. Ele está conduzindo um
trabalho para implementar novas camadas de aperfeiçoamento da
gestão do banco, no sentido de mais eficiência e aumento do volume
de negócios. Tenho confiança nas propostas que o Marcelo está
desenvolvendo, voltado sempre para quê? Para maior satisfação dos
clientes, dos investidores e dos acionistas. Esse é um foco claro
da administração. O Conselho tem orientado ao colegiado, que é
presidido pelo Marcelo, que em um mundo em transformação acelerada,
a importância é acelerar o passo com muito senso de urgência
naquilo que deve ser feito. É a expectativa.
Informações Broadcast
BRADESCO ON (BOV:BBDC3)
Historical Stock Chart
From Aug 2024 to Sep 2024
BRADESCO ON (BOV:BBDC3)
Historical Stock Chart
From Sep 2023 to Sep 2024